Em poucos dias, uma nova mãe

Em um blog sobre cristianismo, jornalismo, política e sociedade como o esse, cabe demais o tema “maternidade”, mas mesmo assim, eu estou escrevendo um texto sobre esse tempo bem no finalzinho da minha gestação. Hoje, estou com 37 semanas e 3 dias, ou seja, no nono e último mês. Durante esse tempo, pensei por várias vezes em escrever, mas escolhi fazer isso só quando eu estivesse me sentindo mais calma, e acredite, demorou tudo isso mesmo.

Tenho plena certeza de cada mulher tem uma experiência diferente durante esse tempo de gestar, por isso não pretendo partilhar dicas ou coisas assim, mas sim ficar dentro do tema do blog, refletindo sobre o que a maternidade despertou em mim. E esse é um dos textos mais pessoais que existirá aqui. Esse é um texto sobre a chegada do Arthur.

Começo

Eu sempre quis ser mãe. Meus amigos e amigas mais próximos sabiam e torciam por isso. No entanto esse desejo foi puxado constantemente por um querer o tempo certo para isso, um momento de estabilidade em todos os sentidos, e não foi assim. Nossa família vivia um tempo de suspender esse sonho temporariamente quando pegamos o teste positivo nas mãos, e o incrível foi que, apesar de todo o nosso jeito sistemático, de todo o meu jeito metódico e diante de um cenário incerto, a alegria e a certeza foi muito maior que a ponderação sobre essas coisas. Arthur foi maior que tudo para mim. Desde o dia zero. A maternidade desejada é revolucionária por tantos motivos, mas especialmente por impulsionar a intuição para além do racional.

Isso não quer dizer que eu não vivi o medo. Eu sentei e conversei com meu esposo sobre todas as mudanças, as problemáticas e coloquei para fora os muitos motivos de ansiedade… E novamente, mesmo não sendo o momento perfeito, nós aprendemos no decorrer dos dias a viver a paz de Deus que excede todo o entendimento, e foi só isso que nos permitiu viver a plenitude da felicidade que tem sido essa espera.

“E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará os vossos corações e os vossos pensamentos em Cristo Jesus.”Filipenses 4:7

Registrar

Uma das coisas que eu sempre quis, foi ter disposição para registrar os momentos cotidianos e especiais da minha gestação, e eu consegui fazer isso. Consegui gravar dezenas de vídeos, incluindo do momento em que descobrimos e do dia em que contamos para as nossas famílias e alguns amigos e amigas, ampliando essa rede de felicidade e expectativa. Apesar de reconhecer o quão especiais são esses momentos, há algo de incrível nos vídeos cotidianos, que vão desde os registros da gente falando com ele sobre coisinhas que decidimos, até imagens do Anderson montando o berço e furando as paredes para as prateleiras do quarto. São imagens da Fiona, nossa cachorrinha, tentando entender a barriga e da gente levando ele para viajar. Fotos e fotos e fotos dele crescendo, inclusive essas lindas do ensaio na natureza com o qual eu tanto sonhei. Sobre essas imagens todas, eu sempre ouço o quanto eu pareço feliz, e eu posso garantir que não é só parecer. É estar feliz demais!

Fotos da linda Camila Amadei – @camilaamadeifotografia

Além desses vídeos e fotos, eu fiz um caderno onde escrevo sobre cada momento importante ou preocupante, um diário de gestação onde converso com o Arthur desde o começo sobre tudo: exames, momentos e escolhas. E mais! A tia Luana fez um livro de memórias personalizado para eu continuar guardando memórias durante todo o primeiro ano dele, mês a mês, novidade por novidade. Ele ganhou música com seu nome, lembrança de viagem, coisinhas personalizadas e tanto, mas tanto amor dos nossos amigos e amigas, que eu preciso que ele saiba.

Registrar me pareceu algo muito importante quando comecei a pensar sobre quanto tempo terei com ele, e sobre como eu quero que ele saiba o tanto que eu desejei que estivesse tudo o mais perfeito possível para a sua chegada. E melhor: não somente eu. Nós. E esse “nós” vai para muito além dos pais e da famíia. E eu só vou evitar citar nomes para não esquecer de alguém agora, mas ele vai saber.

Os teus olhos viram o meu embrião; todos os dias determinados para mim foram escritos no teu livro antes de qualquer deles existir.” – Salmos 139:16

Prioridades e cuidados

Com tantas coisas para serem feitas, como exames, exercícios e aprendizados relacionados à gestação, senti que o meu tempo disponível reduziu muito, e eu acho que isso é bem comum especialmente entre mães que trabalham fora ou são as únicas responsáveis por cuidar da casa ou da família. Eu basicamente escolhi manter o trabalho em dia, cuidar de mim, e apoiar minha família até quando eu pudesse. Isso me custou lutar contra muita culpa, até porque eu fazia até então parte da rede de apoio que cuida da minha avó, e a minha ausência representaria menos tempo livre para meus pais e irmãos, ou seja, eu também não poderia contar tanto com a presença deles nesse momento. Cada família tem uma dinâmica única, e essa seria a nossa realidade: todos e todas fazendo o seu melhor, o seu possível.

Acho que esse cenário também me forçou a pensar nas relações familiares que eu desejo para o Arthur, e são relações de presença, de paz, de viver perto dos avós paternos e maternos, dos tios e tias, sejam de sangue ou dos que fazem parte da família de fé. Aliás, essa família de fé, a igreja, tem sido um exemplo de expectativa pela chegada desse menino refletita em cuidado e em acolhimento. Por isso fico feliz de ter conseguido continuar a ir na igreja e a ser cuidada pela alegria dos meus irmãos e irmãs. Priorizar (na medida do possível) o lugar onde Deus me chamou para servir o reino, me acrescentou demais.

Mas, buscai primeiro o reino de Deus, e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas.” – Mateus 6:33

Organizar (e reorganizar) tudo

Cerca de um ano antes do Arthur chegar, nós nos mudamos de uma casa para um apartamento. Quem já fez isso conhece a necessidade de se livrar de coisas para fazer espaço. Isso, somado à chegada de um filho, nos impulsiona a se organizar mais ainda. Essa experiência me obrigou a rever absolutamente todos os meus pertences, roupas, lembranças, louças, móveis… Tudo! O interessante foi ver que que a vontade de fazer espaço para o quarto e para o brincar do Arthur foi bem maior do que o desejo de guardar algumas coisas. Quando colocadas em perspectiva, muitas coisas perderam a importância perto dele.

Nossa casa se esvaziou para ficar mais cheia. Coisas deram espaço para uma pessoa nova. Tudo parece muito mais leve agora. O quarto que antes guardava uma cama e coisas antigas em um guarda roupas pouco acessado, agora acolhe o quarto do Arthur, os livros do Arthur que eu venho comprando e ganhando nos últimos 10 anos, as roupinhas, fraldas e coisinhas que tantas pessoas escolheram para ele.

Detalhes do quartinho do Arthur com ursos, nuves, estrelas e livros

O Arthur nos reorganizou a vida, mesmo antes de chegar. Ele nos incentivou a repensar e a abrir mão de coisas que já foram importantes, e sabemos que esse é só o começo de uma grande mudança, mas já nos mostrou que é verdade o que dizem sobre priorizar nossos filhos. Isso me fez pensar também no quanto nossos pais mudaram a vida por nós. Me fez pensar no quanto as minhas amigas que se tornaram mães e amigos que se tornaram pais, viveram um tempo de grande mudança muitas vezes silencioso e solitário.

Por vezes me senti um pouco sozinha, mesmo com o Anderson sempre comigo. Senti falta das amizades que moram longe, de familiares ocupados, mas nunca de Deus. A fé foi ferramenta indispensável nos momentos de hormônios bagunçadíssimos. Por isso, toda a minha admiração para pessoas que promovem grupos de apoio para novos pais e mães, e daqueles costumes antigos que incentivam especialmente mulheres a se acompanharem e se apoiarem nesse período. Muitas mulheres da minha família tem me mostrado que esse costume é vivo, o que me enche de gratidão e esperança.

O Senhor está perto de todos os que o invocam, de todos os que o invocam com sinceridade. Realiza os desejos daqueles que o temem; ouve-os gritar por socorro e os salva.” – Salmos 145:18,19

Se emocionar

Nesse último final de semana, nós vimos finalmente tudo pronto. O quarto, a mala da maternidade, as roupas todas lavadas e a casa com tudo no lugar. O sentimento não foi só de alívio, foi de orgulho. Nós arrumamos tudo para o nosso filho. Foi dentro das nossas possibilidades e limitações sim e não é um grande espaço, mas é com certeza o nosso melhor e isso é suficiente. Hoje, depois de ter mostrado o quartinho pronto para a minha terapeura, ela me lembrou da caminhada que foi arrumar uma coisa a cada dia, a cada semana, e o quanto foi superado no decorrer desses dias. Depois da consulta, eu basicamente sentei no quarto, chorei e orei agradecendo a Deus pela força que fluiu no meio de tantas inseguranças e dúvidas. Eu vou curtir os últimos dias da minha gestação orgulhosa, mesmo estando cansada e fazendo tudo bem devagar agora por causa dos pés inchados e indisposição. Eu vivi esse tempo com toda a intensidade do meu coração, porque quis viver, e isso faz toda a diferença.

Eu quero muito escrever meu relato de parto aqui, pois relatos de parto são textos lindos e cheio da beleza do feminino. Ser feminista e cristã tem facilitado muito meu preparo para essa hora. Acreditar na força do corpo que Deus criou, sabe? Medo temos aos montes, mas confiança também. A Ruah divina estará lá, me acolhendo, me emocionando e trazendo meu Arthur para os meus braços, meu seio, meu colo, minha vida.

A mulher que está dando à luz sente dores, porque chegou a sua hora; mas, quando o bebê nasce, ela esquece a angústia, por causa da alegria de ter nascido no mundo um menino.” – João 16:21

Fotos da linda Camila Amadei – @camilaamadeifotografia