Imagem: Priscilla Du Preez | Unsplash
“…permaneçam as mulheres em silêncio nas igrejas, pois não lhes é permitido falar; antes permaneçam em submissão, como diz a lei. Se quiserem aprender alguma coisa, que perguntem a seus maridos em casa; pois é vergonhoso uma mulher falar na igreja.” – 1 Coríntios 14:34,35
Esse versículo me persegue. Não é algo que me perseguiu e do qual eu já estou livre. Ele me perseguiu hoje mesmo. É recorrente, especialmente nas igrejas pentecostais brasileiras, que se cobre da mulher o silêncio.
Um dos motivos que me leva a rejeitar a instrução, é considerar o contexto histórico em que ela é oferecida. O texto defende que era vergonhoso uma mulher falar naquela sociedade. Isso explica a sociedade, não a vontade de Deus. E nesse texto, esse é o máximo de análise bíblica que farei. Eu não vou me atrever a fazer uma leitura teológica, e repito com certa frequência que não tenho credenciais para isso. Sou apenas cooperadora na minha igreja, onde estou desde que nasci. Além disso, meu pai é o meu pastor, e ele é o homem que mais me ama no mundo. Geralmente me ouve, até quando o deixo muito bravo. Esses fatores me inibem um pouco hoje de me considerar a mais indicada para uma análise teológico. Faço apenas rascunhos disso, como fiz há uns anos aqui, no artigo sobre Feminismo para cristãos.
O que eu sou, é jornalista. Eu converso com as pessoas e checo informações para chegar o mais perto da verdade possível. Então o que eu compartilho aqui é uma reflexão sobre as mulheres não se calarem, até quando dizem concordar com a instrução acima. O silêncio das mulheres não é a realidade nas igrejas e nós precisamos parar de defender isso e de ensinar para as meninas, antes que nos tornemos um sistema que gera ainda mais frustração nas pessoas.
As mulheres falam nas igrejas. Elas pregam, ministram louvores, ensinam nos grupos. As mulheres estão nas ações sociais, nas escolas dominical, nos grupos de oração e de aconselhamento e elas não estão em silêncio. O número de mulheres na minha igreja sempre foi maior do que o número de homens, e esse cenário se repete em todo o país. Segundo a pesquisa do Datafolha de dezembro de 2019, as mulheres representam 58% do total nas igrejas evangélicas brasileiras. Nas igrejas neo pentecostais (onde elas são ainda mais expostas ao discurso do silêncio feminino na minha opinião), esse número atinge 69%. Saiba mais sobre essa pesquisa aqui.
Elas não estão em silêncio. Elas estão trabalhando invisibilizadas, silenciadas. Eu não vou defender que elas trabalham sem reconhecimento, pois eu sei que Deus reconhece. Essa não é a questão desse texto, antes que apareça o comentário “é pra Deus ver”. Sim, Deus vê. Amém. Não é ele quem está sendo questionado aqui, mas quem defende que elas se calem. Eles as deixam trabalhar, contanto que eles sejam o rosto e a autoridade nas igrejas.
Uma das coisas que mais me dói na instrução bíblica ensinada acima, é que a mulher pergunte ao seu marido em casa, no caso de ter dúvidas. Eu cresci em uma igreja onde muitas mulheres iam para a igreja sem seus maridos. Eu mesmo vou na maioria das vezes sem o meu. Se eu estivesse presa nesse ensinamento ao invés de ter me lançado no estudo da Palavra de Deus e na liberdade de Cristo, eu não estaria ministrando.
As mulheres vem sendo massacradas pela imposição de um silêncio injusto há muito tempo, e o mundo, a natureza e a igreja tem sofrido as consequências disso. Precisamos de igualdade, equilíbrio e isso não é uma questão de opinião. O Feminismo defende que a mulher deve ter as mesmas oportunidades e os mesmos direitos que os homens. Isso é igualdade de gênero, e não é questão de opinião. Quando alguém diz que não precisa discutir isso, não está agindo em defesa da sua religião. Isso é opressão!
Nós temos que olhar para isso de forma escancarada, assim como temos que olhar para algumas verdades sem tomar tanto cuidado ao falar, pois isso tem destruído a igreja de Cristo. A nossa missão é levar as pessoas até Cristo. Essa é a missão de todas as pessoas cristãs: levar o amor e a salvação amorosa de Cristo para todas as pessoas, independente do seu gênero e de qualquer outra coisa. Não decidimos quem fala e quem ouve. Não cabe a nós restringir quem ocupa qual cargo, quando estamos cansados de saber que é Deus quem chama, santifica e vocaciona sem confusão. Sabe o que eu entendo que nos cabe? Parar de negociar o que sabemos que Cristo realmente ensina.
- Racismo é crime e pecado, até quando “é brincadeira”;
- Tortura e discurso que defende a prática da tortura, é crime e pecado, até quando “é o jeito dele falar”;
- Desigualdade de gênero é injustiça e pecado, até quando “tá na bíblia que é assim”;
Por fim, temos que parar de negociar com pastores, líderes e pessoas que se dizem cristãs mas tem falas racistas, machistas ou em defesa de quem apoia a tortura, o machismo e o racismo. Estejam eles ocupando o espaço que estiverem, sendo a autoridade que for, ou sentados ao lado de quem estiver.
Eu sou mulher, e minha voz está para o reino, seja através de mensagens, textos, canto, ou que Jesus quiser. Eu sou mulher, e eu não me calo na igreja.
Excelente artigo! Sucinto, objetivo e contundente , pois é assim que a Verdade se apresenta a nós. Fico feliz em ler um artigo sólido no final de uma noite após ver a ministração direcionada de um clérigo aos seus ouvintes num meio de comunicação social. Este se opõe àquele e deixa clara a diferença de interpretação das Escrituras. Graça e Paz Sara
Tava pensando sobre isso hoje. Não necessariamente sobre esse versículo, mas sobre como não pensar na Bíblia como um livro único, atrapalha o entendimento geral do que ela diz.